terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Sobre Crianças e Sabiás



Tenho o hábito de alimentar passarinhos no meu pátio. Compro alpiste, quirela, girassol, aveia, além de frutas como mamão, banana e laranja e coloco em cima do muro, nas árvores e no pátio, sempre acompanhados de vasilhames com água fresca. O resultado é que sou visitada pelos mais diversos tipos de pássaros. Tem pomba rola, sabiá, bem te vi, João de Barro e vários outros que desconheço o nome, de cores e tamanhos variados.

Tem alguns que se instalaram para valer em minha casa. Um João de Barro fez sua morada em minha sacada, outros no jardim e por último um sabiá (ou uma sabiá) fez seu ninho próximo a churrasqueira. Acompanhei a construção do ninho e o período de chogagem dos ovos até o nascimento de dois bebês sabiás.

Outro dia, enquanto almoçávamos ouvi a maior gritaria no pátio, uma mistura de latidos e gritos de pássaros. Um filhote havia caído do ninho enquanto Fred (meu salsichinha) tentava estraçalhá-lo. Eu e meus filhos corremos e conseguimos salvar o filhote, enquanto Fred salivava imaginando o sabor da caça perdida. Peguei uma escada e coloquei o dito cujo de volta em seu ninho.

Passados dois dias eis que o filhote se joga ao chão de novo, como já estava com penas e bem taludinho conversei com ele e disse que precisava aprender a se virar sozinho e que eu não o colocaria no ninho novamente, mas que não se preocupasse pois Fred permaneceria preso dentro de casa até ele aprender a voar.

Passei a observar o filhote da sacada, dando rasantes pelo pátio e sua mãe sempre observando de cima do muro, trazendo minhocas para alimentá-lo. Uma noite ele dormiu em cima de um pé de couve, outra noite na beira de um vaso, e a dona Sabiá o tempo todo cuidando do filho á distância, até que um belo dia ele levantou vôo e se mandou.

Essa mãe Sabiá me levou a pensar nas crianças com as quais nos deparamos constantemente, abandonadas, sofredoras de maus tratos, tendo seus direitos violados a todo instante, muitíssimas vezes pelos próprios pais, pelos que deveriam zelar, proteger, amparar e que acabam sendo os algozes de seres indefesos.

Quantas vezes cruzamos com mães que carregam bebês como se fossem um saco de farinha, de qualquer jeito, quantas vezes nos deparamos com gestantes fumando, bebendo e se drogando, como se o que carregassem no ventre fosse um saco de batatas e não um ser humano.

Depois recebemos essas crianças nas salas de aulas, encontramo-as nas ruas, nos onibus, nas sinaleiras, e rotulamo-as de marginais, difíceis, mal educadas e tantas outras imprompéries.

Será que se esses rebentos tivessem tido a oportunidade de ter uma mãe sabiá a cuidar deles teriam certos comportamentos e atitudes que nos incomodam e nos chocam? Reflitamos sobre isso.

Eu acredito que não, e tenho convicção de que a raiz de todos os males, de toda a marginalidade entre crianças e jovens tem apenas uma raiz: a falta de amor, a falda de cuidado e de proteção.

E que fique bem claro, essa ausência de cuidados não é restrita apenas as camadas mais pobres da população, ela se encontra também em lares abastados com mesas fartas e todo o tipo de conforto.

Afinal de contas, os grandes bandidos de nosso país que usam terno e gravata, e que através de uma simples assinatura ao fazerem leis e desviarem verbas, deixam milhões de cidadãos em condições de miséria total se tivessem tido pais cuidadosos, bons exemplos, valores morais sólidos, será que agiriam dessa forma? Penso que não.

Nesse ano que acabou de começar que bom seria se pudéssemos ter mais mães sabiás a cuidar de nossos futuros cidadãos, para podermos acreditar em um País com mais justiça e igualdade para todos.